sexta-feira, 20 de julho de 2012

Leopoldina: busca pela solidificação das ações já existentes e pela implantação de novas ideias

Rosângela Lima - Secretária de Cultura de Leopoldina

Leopoldina, cidade típica do interior mineiro com 51.101 habitantes , foi onde o pernambucano, Augusto dos Anjos, passou os últimos anos de sua vida e está enterrado. Em retribuição a acolhida o poeta a escolheu para guardar seus objetos pessoais, móveis e manuscritos. Tudo isto está comprovado em documentos redigidos por seu próprio punho, segundo os gestores da área cultural da cidade. Para realizar o desejo do ilustre morador a casa onde morou foi comprada pela prefeitura, e passou por restauração e ampliação sendo transformada no Museu Espaço dos Anjos, podendo então, abrigar seus pertences e torná-los acessíveis ao público.

O poeta, no entanto teria sua conhecida angústia ampliada se soubesse que a cidade que o encantou passou por anos adormecida culturalmente. Apesar de possuir uma pasta para a cultura desde 2005, apenas a partir de 2009 conta com gestão exclusiva e atuante que passou a organizar e potencializar as ações culturais vigentes e a implantar novos projetos. A responsável pelas iniciativas é Rosângela Lima, que através de prestação de contas e ações culturais conseguiu aumentar o ICMS cultural do município de dez para duzentos mil reais por ano. Com isto pode restaurar o prédio histórico que sedia a prefeitura e o Museu Espaço dos Anjos, que além de conservar as lembranças de seu antigo morador abriga biblioteca temática, pub, teatro de arena de 50 lugares e sala de exposições temporárias. A partir daí se tornou chefe de fomento e incentivo à cultura, refez o conselho de patrimônio e criou o de cultura, tornando-se superintendente de cultura em 2010 e secretária em 2012. Esta trajetória profissional se deu em paralelo às inúmeras políticas culturais que implantou.

Em 2010, ao lado de artistas e produtores culturais propôs a criação de alternativas para promover, divulgar e fomentar o movimento cultural local. A primeira ideia implantada foi o Conversa de Botequim que tem como objetivo abrir espaço para a manifestação do samba de raiz, dar assistência a outros projetos culturais, fomentar e difundir os artistas locais, resgatar a memória e cultura dos botecos mineiros e desenvolver a economia criativa e sustentável. Depois de cinco edições foi transformado no Festival Conversa de Botequim: comida de boteco, festival de doces e artesanato de Tebas, evento que como o samba, já possui raízes solidificadas. Ampliou também o Concurso Nacional de Poesias Augusto dos Anjos em número de inscritos – de 128 em 2009, para 600 em 2011 – e em duração, de um dia para uma semana. As poesias produzidas foram difundidas através de declamações em hotéis, supermercados, praças, ônibus e bancos e o evento passou a contar com palestras e bate papos com poetas e escritores nacionais.

Leopoldina é palco de políticas culturais desenvolvidas por instituições distintas como é o caso do Gedec Teatro de Rua conduzido por organização religiosa; do Festival de Gastronomia e Cultura de Piacatuba, a Usina Cultural e da Casa de Leitura Lya Maria Müller Botelho organizados e mantidos pelo Grupo Energisa; do conservatório de música mantido pelo Estado de Minas Gerais em parceria com o município; da Academia Leopoldinense de Letras e Artes; do Festival de Charretes no distrito de Piacatuba realizado por iniciativa civil, da Feira Regional de Artesanato e Feira da Paz pela Associação das Pioneiras de Leopoldina, da Casa de Cultura de Piacatuba e das criações recentes do projeto de educação patrimonial, do Arquivo Público Municipal e do Festival de Banda de Praça, todos sob a responsabilidade da prefeitura; além da cidade, ser também uma das poucas da Zona da Mata Mineira a contar com um conselho de cultura e fazer parte do Pólo Audiovisual de Cataguases e Região.

Mesmo com toda esta ampliação a gestão atual ainda considera o fomento à cultura um de seus maiores problemas e acredita que isto se dá pela falta de aceitabilidade e visão governamental. “Alguns governantes veem a cultura como a cereja do bolo e não oferecem subsídios aos projetos. A importância da cultura para eles é momentânea, seu objetivo é apenas ilustrar eventos de ‘maior importância’. Feita a apresentação, os artistas voltam para suas casas sem nenhum apoio intelectual ou financeiro, pois não são mais necessários.”  

Quando os gestores foram questionados sobre a identidade cultural do município o Morro do Cruzeiro foi ovacionado como a principal referência cultural da cidade tendo o musicista leopoldinense, Serginho do Rock, como seu principal enaltecedor. O artista assim o descreve em seus versos: 

Neste pedaço de serra
O mundo é bem diferente
Aqui eu vivo sempre contente
E a vida é pura e natural
Sua paz envolvente
Me faz bem consciente
De viver longe do mal
Vivendo com os animais
Dentro do meu quintal
Em contato permanente
Com as coisas reais
Plantando e colhendo
Frutos naturais
Deixe os traumas lá embaixo
E suba o Morro do Cruzeiro
Vem ouvir o seu silêncio
Este meu velho companheiro
Situado no ponto culminante
Vejo o sol nascendo e se pondo
Por trás da linha do horizonte
Lá embaixo, no vale que aparece
Vejo apertada entre as colinas
Minha pequena Leopoldina

Berço e morada de poetas, Leopoldina necessita dar continuidade a estas políticas para que a criatividade não se perca com o passar dos anos. Rosângela está ciente de sua responsabilidade. Para ela a importância da preservação dos bens culturais, materiais ou simbólicos, se emparelha com a da criação. A primeira por resguardar e não deixar que se perca a identidade cultural do município e a segunda por o novo ampliar os horizontes e trazer novas perspectivas para o futuro. Acrescenta ainda a importância em se copiar. “Acredito que se deu certo com você, poderá também dar certo comigo. Quando copio, faço diferente e tenho oportunidade de fazer surgir o novo”.  

Para os gestores culturais de Leopoldina, as políticas públicas de cultura têm que proporcionar o descobrimento da história e da identidade do povo, além de promover a esperança onde esta já se perdeu. Tem que preparar as pessoas para que reconheçam e valorizem seus bens culturais, e finalmente devem promover o intercâmbio entre o conhecimento acadêmico e o popular, resgatando o folclore, as relações sociais, políticas e econômicas. Uma cidade de poetas, acolhedora, que encanta e que inspira não pode ser colocada às margens das iniciativas que valorizem a cultura.

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